AnálisesSwitch

Fae Farm – Análise

Fae Farm junta-se a um elenco de jogos na Nintendo Switch que prometem uma experiência descontraída e recompensadora, sem emoções fortes ou situações capazes de pôr os nervos em franja. Esta obra do estúdio e editora canadiana Phoenix Labs vem assim fazer companhia a nomes como Animal Crossing e Stardew Valley, onde a alma da experiência é feita de atividades do dia-a-dia, a construir relações com outras personagens, e com uma pequena dimensão aventureira.

Não há qualquer dúvida, Fae Farm faz muita coisa: o jogo pode ser personalizado até à ponta dos cabelos, e podemos conferir à nossa personagem uma multiplicidade de características distintas que podem ser alteradas a qualquer momento. É também um jogo muito inclusivo, que além da nossa personagem permite ainda a jogadores com daltonismo escolher a palete de cores que melhor se adequa à sua visão. O enredo coloca-nos na pele de uma personagem cujo barco deu à costa de uma ilha de nome Azoria depois de responder a uma mensagem numa garrafa. Somos alvo de uma receção exemplar por parte da presidente da câmara, que nos oferece uma casa e um lote de terra, e começamos a conhecer habitantes que nos contam as vicissitudes de Azoria e nos ensinam uma série de aptidões vitais através de tarefas simples. A nossa personagem é ‘muda’, pelo que não tem frases atribuídas e os diálogos com as outras personagens acabam na prática por ser monólogos, o que torna as interações demasiado unilaterais, um dos pontos fracos desta vertente de Fae Farm.

Ao desempenhar tarefas simples e acessíveis aprendemos as artes e ofícios do quotidiano, que incluem agricultura, pecuária, pesca, apanha de insetos, mineração, etc., todas elas com os seus pontos de experiência. Graças aos recursos que apanhamos ao longo do jogo podemos comprar ferramentas com melhores capacidades, ferramentas essas que nos permitem obter recursos de forma mais eficiente e com isso, desenvolver a nossa quinta e produzir mais objetos. A quantidade de objetos que podemos produzir é enorme, e vai de vasos de plantas a cercas, passando por soalhos e tapetes, máquinas de fazer bebidas, fertilizantes e produtos para animais. Muitos objetos não podem ser fabricados sem unidades a que o jogo chama de ‘estações’, quer no original em inglês, quer na tradução (razoável) para português do Brasil. Além de exigir matérias-primas, cada objeto exige também uma receita, ou fórmula, se quisermos ser mais generosos. Estas encontram-se um pouco por todo o lado e é comum encontrarmos algumas ao longo de apenas vinte ou trinta minutos de jogo. A nível de conteúdo Fae Farm é então um jogo riquíssimo, e o almanaque que podemos consultar a qualquer momento tem material que nunca mais acaba – e sim, isto é um elogio.

Seria fácil perdermo-nos com tanta coisa, mas o jogo encarrega-se de nos lembrar que tem um enredo, e com as suas particularidades. Vamos ter de lidar com alguns problemas de Azoria, nomeadamente os redemoinhos que cercam a ilha e impedem a circulação marítima (um deles foi responsável pela chegada pouco confortável da nossa personagem à ilha), uma tempestade de neve, um vulcão ativo, e uma série de espinhos e neblina escura que se encontram em alguns pontos, tudo coisas que farão o seu sentido à medida que avançamos. As três masmorras não são o que se encontra em RPGs ou jogos de aventuras – Fae Farm não é nada disso. A ênfase não vai para a exploração das masmorras nem da (pequena) ilha, e embora apresentem inimigos estes não são como os que se encontram em jogos de aventuras. O propósito das masmorras vai para a mineração de recursos e uma vez concluída cada uma, resolvemos um dos problemas de Azoria. Infelizmente também constituem uma dimensão pouco motivante e bastante repetitiva.

Cada masmorra tem vinte e cinco pisos e para abrirmos a porta para o piso seguinte temos de ativar um mecanismo que se encontra escondido sob uma de muitas pedras. Isto significa que vamos ter de partir pedra até o encontrarmos. Ao sair da masmorra, temos de recomeçar do início. O sistema de tempo de Fae Farm coloca-nos a viver o dia-a-dia da nossa personagem e quando chega a meia-noite, somos automaticamente enviados para a cama para recuperar os nossos indicadores, sem forma de o evitar, pelo que se estivermos a meio de uma masmorra temos de recomeçar o processo do início. É possível manter as portas abertas se colocarmos um selo em cada piso, mas para isso temos de fabricar os selos e estes exigem mineração de recursos – ou seja, partir pedra outra vez. Comparadas com a experiência do dia-a-dia, as masmorras acabam por parecer algo forçadas e colocam-nos obrigações algo redundantes. Compreende-se a sua função mas é difícil não pensar que talvez o jogo beneficiasse de masmorras mais criativas e mais curtas.

Sem dúvida que Fae Farm é um jogo riquíssimo – e muito bonito de se ver, a componente visual merece elogios rasgados pelo seu aspeto colorido e acolhedor – mas à medida que avançamos perde-se facilmente a noção do que temos de fazer devido à quantidade de tarefas e de variáveis a acompanhar. São muitas coisas para fazer, o que pode parecer contraditório com um jogo que pretende criar uma experiência descontraída. Acontece o inevitável, e acabamos por estabelecer prioridades, como na vida real, mas acaba por deixar uma certa frustração a quem gosta de preencher todas as casas. As masmorras são um dos pontos baixos devido à repetição e alguma redundância que nos impõem, enquanto as interações com as outras personagens, incluindo aquelas com quem desenvolvemos relações de amizade e uma personagem que escolhemos para casar, são limitadas e com pouco para oferecer a nível dos diálogos, ou monólogos, como seria mais acertado chamar-lhes, mas é importante não descurar a vertente social que nos pode trazer bastantes vantagens.

Fae Farm inclui ainda uma componente multijogador, local e “online”, mas torna-se difícil de a avaliar quando a modalidade local exige pelo menos mais uma pessoa com o jogo, enquanto a modalidade “online” tem as suas própria regras. Por outro lado, pode ser jogado online com pessoas que tenham o jogo no PC, mas para isso é preciso abrir uma conta na Phoenix Labs e criar a nossa própria lista de amigos, independente dos nossos amigos na Nintendo Switch. Por outras palavras, existe variedade e é possível jogar “online” entre plataformas, mas a experiência é limitada. O balanço final é então um jogo extremamente rico, bonito, e com uma quantidade impressionante de recursos e ajudas que nos mantêm informados sobre o que precisamos de fazer. Ao mesmo tempo, as masmorras são mais repetitivas do que cativantes, e a quantidade de coisas para fazer e a interação superficial com as outras personagens arrefecem algum do entusiasmo com que começamos. Acrescente-se que Fae Farm tem uma longevidade impressionante e leva-nos ao longo das quatro estações do ano, cada uma com as suas particularidades e exigências, é possível fazermos dezenas de horas sem sequer chegarmos ao fim do enredo. Por outro lado, seria bom se não demorasse mais de sessenta segundos para começar, e outros tantos segundos para carregar a partir do ecrã de título, algo que não se compreende.

CONCLUSÃO

CONCLUSÃO
7 10 0 1
Fae Farm apresenta muitos argumentos favoráveis no que diz respeito a uma experiência descontraída para o dia-a-dia. O jogo é riquíssimo em recursos e objetos, e há sempre alguma coisa para fazer. Por outro lado, as masmorras são mais repetitivas do que divertidas, as outras personagens não são propriamente fascinantes, e a quantidade de coisas para fazer acaba por prejudicar um pouco a experiência, mas também há muita coisa boa a retirar, e Fae Farm pode trazer-nos muitas horas de jogo se não tivermos a ambição exagerada de fazer tudo ao mesmo tempo.
Fae Farm apresenta muitos argumentos favoráveis no que diz respeito a uma experiência descontraída para o dia-a-dia. O jogo é riquíssimo em recursos e objetos, e há sempre alguma coisa para fazer. Por outro lado, as masmorras são mais repetitivas do que divertidas, as outras personagens não são propriamente fascinantes, e a quantidade de coisas para fazer acaba por prejudicar um pouco a experiência, mas também há muita coisa boa a retirar, e Fae Farm pode trazer-nos muitas horas de jogo se não tivermos a ambição exagerada de fazer tudo ao mesmo tempo.
7/10
Total Score

Pontos positivos

  • Riquíssimo em conteúdo e atividades
  • Esteticamente muito bonito
  • Experiência personalizável e inclusiva

Pontos negativos

  • Masmorras repetitivas e redundantes
  • Fácil de se perder a noção das atividades

João Dias

Apreciador de jogos de outras épocas, não diz que não a uma boa obra dos nossos tempos. Diz-se que é por ele que passam os textos antes da publicação, o que significa que é uma espécie de boss final da escrita para os outros membros da equipa.