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Emio – The Smiling Man: Famicom Detective Club – Análise

Os jogos “visual novel” não costumam estar entre os mais populares, sobretudo se perguntarmos aos jogadores ocidentais, mas isto não significa que não existam exemplos positivos. A jogabilidade menos dedicada à ação e que não recompensa reflexos rápidos torna-os propensos a experiências mais introspetivas e quase sempre a solo. Ao juntar elementos de aventuras “point and click”, alguns títulos mais recentes ganharam grande destaque. A série Phoenix Wright: Ace Attorney conquistou o seu próprio espaço e goza de um enorme reconhecimento, enquanto Gnosia e PARANORMASIGHT (ambos disponíveis na Nintendo Switch) são exemplos de títulos elogiadíssimos pela crítica.

Emio – The Smiling Man: Famicom Detective Club insere-se numa série de “visual novels” da Nintendo com elementos de aventura “point and click” que até há relativamente pouco tempo eram quase desconhecidos fora do Japão. Os dois primeiros jogos da série, de 1988 e 1989, fizeram parte do catálogo do Famicom (mais concretamente, do Famicom Disk System), e um terceiro jogo foi lançado em 1997 apenas através do serviço de subscrição Satellaview. Saltamos para o ano 2021 e os dois primeiros Famicom Detective Club tiveram direito a um “remake” para a Nintendo Switch, mas o jogo que aqui nos interessa, The Smiling Man, não é um “remake”, é uma obra inteiramente nova e com a produção a cargo do mesmo “designer” dos dois Famicom Detective Club originais, Yoshio Sakamoto.

Uma das primeiras coisas que pode surpreender é a classificação etária: não é comum vermos um jogo produzido e editado pela Nintendo (co-desenvolvido com o estúdio japonês Mages) a receber uma classificação para maiores de 18 anos. Se normalmente associamos esta classificação a jogos com um conteúdo mais gráfico, talvez seja possível de justificar com base na carga emocional e psicológica do jogo. Vamos assumir o papel de um jovem assistente de detetive (e em alguns momentos, o da sua colega) que participa na resolução de uma série de homicídios cujos elementos encaixam numa lenda urbana do passado recente sobre um assassino que abordava vítimas adolescentes. Após matar as suas vítimas, o assassino colocava-lhes um saco na cabeça com uma cara sorridente desenhada. Em The Smiling Man, começam a aparecer crimes semelhantes que requerem investigação. Como é habitual neste género de jogos, vamos falar com pessoas de interesse como testemunhas e polícias, bem como pessoas aleatórias, procurar elementos, ligar pistas e estabelecer nexos de causalidade para podermos solucionar os mistérios e atar pontas soltas.

O jogo faz um excelente trabalho a nível da apresentação. Olhando apenas para a componente visual, nem diríamos que estamos a percorrer uma história perturbadora – quase todos os locais que visitamos parecem perfeitamente normais, o que de certa forma contribui para criar uma sensação de medo e inquietação, afinal o mundo do quotidiano pode ser muito mais perturbador do que um mundo de fantasia ou sobrenatural. O ambiente visual recebeu um trabalho louvável e coloca-nos no meio de um cenário urbano japonês contemporâneo. É certo que não se trata de uma obra feita para levar a Switch ao limite, mas os cenários muitíssimo bem desenhados inserem-se perfeitamente nas convenções dos “visual novels”. A banda sonora, simples e sem pretensões, também – uma música de fundo ligeira, que nunca se sobrepõe nem se intromete demasiado, mas que mais uma vez confere um toque de normalidade quotidiana capaz de nos momentos certos transmitir uma sensação menos tranquilizadora. The Smiling Man faz estas coisas muito bem, e se é verdade que não vamos aqui encontrar cenas violentíssimas a cada cinco minutos, não deixam de existir elementos capaz de deixar os jogadores inquietos. Talvez a classificação para maiores de 18 seja exagerada, mas este não é certamente um jogo indicado para crianças.

E em relação à jogabilidade propriamente dita? Já reconhecemos que estes jogos não são para todos. Um “visual novel” com elementos de aventura “point and click” é um jogo que exige ler cuidadosamente todas as linhas de texto e experimentar todas as interações possíveis – isto vai desde ver o resultado de todas as opções de diálogo a clicar (ou a pressionar) em todos os objetos e elementos, rever notas, e regressar aos pontos de interesse no caso de nos ter escapado alguma coisa até finalmente acertarmos – ou observarmos melhor a expressão visual do nosso interlocutor. Isto torna-se enfadonho e redundante, sobretudo quando o jogo não nos indica que já perguntámos isto ou já observámos aquela pista e a nossa memória pessoal tem limites. Em bastantes momentos, mas sobretudo durante a parte inicial do jogo, podemos facilmente ficar com a impressão de que The Smiling Man é uma lista de coisas a fazer, e isso pode afastar muitos jogadores.

É verdade que ninguém compra um “visual novel” à espera que seja uma explosão de ação frenética, mas The Smiling Man poderia ser mais simpático neste aspeto, já que passar quase dez minutos com cada personagem (incluindo as menos relevantes) a clicar em todas as opções para nos certificarmos que não deixámos nada por fazer é demasiado. Sobretudo quando estamos perante um enredo muito interessante e que nos surpreende mais à medida que avançamos, bem como personagens que dão um colorido especial ao jogo. Para uma investigação de homicídios macabros, a quantidade de humor ligeiro é surpreendente, quase parece um desrespeito para com as vítimas… mas sem humor, a humanidade há muito que estaria perdida.

Os fãs de animação japonesa vão apreciar as vocalizações do texto na língua nipónica. Quem as quiser ouvir noutra língua não vai ter sorte, uma vez que as vozes estão disponíveis apenas em japonês. Já o texto encontra-se traduzido para várias línguas mas não para português, o que significa que quem quiser tirar partido desta experiência tem de ter um nível competente de inglês. Continuam a ser poucos os jogos da própria Nintendo traduzidos para a nossa língua, algo que poderia dar um contributo adicional para as vendas nos casos de títulos como este, que dependem inteiramente da leitura e interpretação de textos para avançarmos.

CONCLUSÃO

CONCLUSÃO
7 10 0 1
Emio - The Smiling Man: Famicom Detective Club é muito competente no que faz de bem, e ao focar-se na investigação de uma série de homicídios relacionados com uma lenda urbana mantém os pés assentes na Terra. A apresentação é belíssima e o seu enredo é muito interessante de acompanhar. Por outro lado, teria beneficiado bastante de uma forma mais direta de abordarmos as opções quando o que aqui temos por vezes assemelha-se demasiado a tentativa e erro. Quem gosta de "visual novels" e aventuras "point and click" recebe The Smiling Man de braços abertos, quem não gosta não vai ser facilmente convertido.
Emio - The Smiling Man: Famicom Detective Club é muito competente no que faz de bem, e ao focar-se na investigação de uma série de homicídios relacionados com uma lenda urbana mantém os pés assentes na Terra. A apresentação é belíssima e o seu enredo é muito interessante de acompanhar. Por outro lado, teria beneficiado bastante de uma forma mais direta de abordarmos as opções quando o que aqui temos por vezes assemelha-se demasiado a tentativa e erro. Quem gosta de "visual novels" e aventuras "point and click" recebe The Smiling Man de braços abertos, quem não gosta não vai ser facilmente convertido.
7/10
Total Score

Pontos positivos

  • Enredo interessante e com bastante humor
  • Ambiente visual muito bem executado
  • Interação simples e competente

Pontos negativos

  • Algumas escolhas repetem-se demasiado
  • Falta de tradução para português

João Dias

Apreciador de jogos de outras épocas, não diz que não a uma boa obra dos nossos tempos. Diz-se que é por ele que passam os textos antes da publicação, o que significa que é uma espécie de boss final da escrita para os outros membros da equipa.

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